sexta-feira, agosto 15, 2003

O apagão é aqui

Escrevo enquanto Nova Iorque está às escuras há mais de sete horas. Por alguns momentos, podemos nos sentir orgulhosos, A barbárie é lá. Mas se olharmos bem em volta e observarmos um pouco melhor as notícias da noite, infelizmente fica claro que o caos ainda é aqui. E já dura uns 500 anos.

Eu explico: hoje o TJ confirmou por unanimidade a absolvição dos policiais (anteriormente absolvidos em primeira instância, no tribunal do Júri) que mataram o bandido do ônibus 174 dentro do camburão, por asfixiamento. O bandido foi capturado vivo, posto no camburão, do qual saiu morto. Não só asfixiado, mas com lesões diversas. Horas antes, aparentemente drogado e após causar uma enorme confusão, tendo ameaçado reféns por horas e parado o trânsito da zona sul do Rio, demonstrou cabalmente a impotência e incompetência da nossa polícia, cuja ação foi digna de pena, tendo resultado na morte de uma pessoa.

Não quero justificar em nada a ação do bandido, mas é insuportável que nosso estado de direito seja frágil a ponto de policiais poderem cometer um ato bárbaro, acompanhado na hora pela imprensa, impossível de ser negado, e saírem impunes. Quem sente um doce sabor de vingança da sociedade com a morte imediata do bandido, está enganado. Esse tipo de ato deveria ser repudiado por todos: é mais um péssimo exemplo de impunidade; é um patente desrespeito à lei, sendo cometido justamente por autoridades constituídas para defendê-la; a acreditar-se na tese da defesa, seria uma demonstração inacreditável de incompetência da polícia. É um retrato do nosso atraso, do nosso subdesenvolvimento. Como um todo, é um caso que explica muito bem o que é este país e por que ainda somos o que somos.

Deixo-os com a transcrição do trecho final da reportagem de Marcelo Dutra, do O Globo Online, publicada hoje às 19h53. Fala por si.


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(...)
O desembargador Hélio de Farias, relator da apelação criminal, rejeitou a alegação do Ministério Público de que a decisão do júri foi contrária às provas existentes no processo. Segundo ele, os jurados acolheram a versão da defesa de que as lesões no pescoço de Sandro foram resultado da luta que o assaltante, que estava drogado, travou com os PMs, dentro do camburão, na tentativa de resistir à prisão.

- As lesões resultaram da resistência da vítima - disse o relator.

O desembargador afirmou também que os policiais sempre admitiram que constrangiram o pescoço de Sandro para detê-lo. Ele leu trechos de laudos da perícia que demonstram a fragilidade da região do pescoço. "A área do pescoço é delicada e frágil e pode provocar a morte mesmo que não se queira", destacou o relator. Ele foi acompanhado em seu voto pelos desembargadores Flávio Magalhães e Maria Raimunda de Azevedo.
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